Durante o mês de setembro, servidoras e servidores do Instituto Federal Catarinense (IFC) participaram do curso “Formação para bancas de heteroidentificação: relações raciais no Brasil e ações afirmativas”, ministrado por servidoras da pró-reitoria de Ações Afirmativas e Equidade (Proafe) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Marilise Luiza Martins dos Reis Sayão, Evelise Santos Sousa e Bárbara Nobrega Simão. Composto por quatro encontros online, com carga horária de 20 horas, o curso capacitou 47 participantes do IFC lotados na reitoria e em 14 campi.
De acordo com Luana Tillmann, coordenadora de Direitos Humanos, Inclusão e Diversidade no IFC, o curso em parceria com a UFSC teve como público alvo servidoras e servidores que atuam nas bancas de heteroidentificação, para processos de ingresso de servidores e estudantes, e do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) no instituto.
“A parceria estabelecida com a UFSC para a oferta deste curso é muito significativa, uma vez que proporcionamos aos servidores do IFC uma formação em serviço de qualidade, com servidoras com conhecimento sobre as relações raciais no Brasil e o impacto das ações afirmativas, além da experiência prática nos processos de heteroidentificação. Da mesma forma, com esse curso, iremos qualificar os processos institucionais das comissões de heteroidentificação, vislumbrando uma avaliação cada vez mais fundamentada em conhecimentos teóricos/práticos e embasamento legal”, destacou Tillmann.
Segundo Marilise Luiza Martins dos Reis Sayão, diretora de Ações Afirmativas e Equidade, na Proafe da UFSC, as parcerias entre instituições públicas federais são fundamentais para o aperfeiçoamento, em conjunto, dos procedimentos nos Programas de Ações Afirmativas, tratando especificamente deste curso. “Quando atuamos de forma interinstitucional, acabamos por melhorar aquilo que fazemos, porque estas formações são momentos de aprendizado e de avaliação daquilo que fazemos, nos espelhando no outro. São sempre momentos ricos, que devem ser cada vez mais rotineiros para que criemos cada vez mais agentes multiplicadores”, realçou a diretora.
Professora no IFC Ibirama e coordenadora do Neabi Institucional no IFC, Amália Cardona Leites participou do curso de formação e também destacou a importância da parceria entre as duas instituições. “A parceria com a UFSC foi fundamental porque pudemos contar não só com a experiência da universidade, mas também com uma leitura das particularidades locais de Santa Catarina. Esta formação era uma demanda histórica e agora podemos dizer que temos um número significativo de servidoras e servidores capacitados para atuarem nas bancas de heteroidentificação. Além disso, na formação também foi possível trocar experiências e sanar diversas dúvidas, o que com certeza vai proporcionar mais tranquilidade e segurança para quem estiver à frente do processo de aferição das declarações étnico-raciais nos campi”, enfatizou a professora.
Para a diretora de Ações Afirmativas e Equidade da UFSC, as bancas de validação de autodeclaração são fundamentais nos processos seletivos nas universidades e institutos federais. “Veja que elas não são um procedimento técnico puro e simples. Elas são mecanismos que atuam na reparação histórica das desigualdades que foram gestadas neste país, resultado do colonialismo, da escravização e do patriarcado e que impactou diretamente no acesso à educação. Histórias pouco abordadas, pouco contadas oficialmente pela perspectiva decolonial e, por isso, complexas e com consequências que precisam ser enfrentadas “pra ontem”, como nos diz Emicida. As bancas, quando bem estruturadas e cientes de seu papel (no aspecto legal e sociológico), garantem que o público ao qual se destina uma vaga de ação afirmativa nos institutos e universidades federais seja de fato ocupada por aquele que a tem por direito. Por isso, sempre reforço nessas formações que cada membro de uma banca é mais do que um avaliador de documentação. Quem dali participa, atua em uma ação de reparação histórica, porque essas bancas são também mecanismos para essa tarefa e que colaboram para o enfrentamento das discriminações e desigualdades arraigadas em nossas instituições”, justificou Sayão.
No conteúdo programático do curso foram abordados os seguintes temas: Legislações antirracistas: fundamentação legal das ações afirmativas e da validação de autodeclaração de negros; Construção social e histórica de raça, racismo: breve história das relações raciais no Brasil e mito da democracia racial; Dimensões do Racismo: anti racismo e branquitude; Políticas afirmativas no Brasil: processo de implementação do Sistema de cotas na educação pública brasileira; Heteroidentificação, ancestralidade e fenótipo: os procedimentos de validação da UFSC.
Enquanto coordenadora do Neabi Institucional, Leites complementa que o conteúdo programático abordado no curso é de grande valia para os Núcleos. “Sabemos que a capacitação adequada de servidoras e servidores que atuam em bancas de heteroidentificação é crucial para garantir a correta concretização dessa política pública que é tão cara para nossa instituição, porém como o Neabi ainda é bastante jovem, não tínhamos as condições para fazê-lo de maneira independente. A formação da UFSC contribuiu enormemente para a capacitação de membros de Neabis que certamente serão multiplicadores deste aprendizado”, destacou a coordenadora.
Segundo Gerson Luis da Luz, professor no IFC Santa Rosa do Sul e coordenador do Neabi no campus, o curso de formação era uma demanda dos grupos que compõem as bancas tanto para admissão de discentes quanto para entrada de novos servidores que entram por cota. “A parte mais importante do curso foi o aprofundamento de questões, que pelo senso comum, pode às vezes fragilizar os argumentos a favor das cotas. As dicas de outras fontes para pesquisa também se destacam, porque assim além do material produzido, quem participou do curso pode avançar e ter mais argumentos para compreender e explicar as questões centrais que norteiam as bancas de heteroidentificação”, apontou o professor.
“Como coordenador local do Neabi e membro do Neabi Institucional foi muito relevante porque através das falas foi destacado que não estamos sozinhos. As agressões e tentativas de sufocamento das culturas negros, indígenas e quilombolas (além de outras minorias) são muito intensificadas e muitas vezes o próprio oprimido se sente culpado por estar em determinados espaços que não deveria. As discussões durante o curso fizeram os ouvintes refletir sobre qual o lugar que estamos hoje e como podemos tornar a sociedade mais justa e menos racista”, ressaltou Luz.
Bancas de heteroidentificação: Segundo a legislação brasileira, os processos seletivos para concursos públicos e para cursos nas universidades e institutos federais devem reservar vagas para público de ações afirmativas, entre elas a ação afirmativa de Pretos, Pardos e Indígenas (PPI). Para concorrer às essas vagas, podem se inscrever as pessoas que se autodeclararem pretas, pardas ou indígenas por meio de autodeclaração étnico-racial. Aquelas que forem aprovadas terão sua autodeclaração aferida e validada por uma comissão específica, que compõe as bancas de heteroidentificação, que utilizará a análise do fenótipo, para pretos e pardos, e documentos específicos no caso dos indígenas. No IFC, as bancas são formadas por servidoras e servidores de diversas áreas.
Texto: Cecom/Reitoria/Rosiane Magalhães
Arte: Cecom/Reitoria/ Andréa Santana